Para o especialista imobiliário Luis Horta e Costa, da Square View, encerrar o programa fiscal para Residentes Não Habituais (RNH) pode significar um retrocesso capaz de esvaziar importantes motores da economia portuguesa. A avaliação é de que os incentivos tributários se tornaram um pilar fundamental para atrair investimentos, talentos e diversificação de negócios nos últimos anos.
Criado em 2009 como uma aposta para impulsionar a retomada após a crise financeira global, o regime RNH oferecia vantagens tributárias substanciais para investidores e profissionais estrangeiros que se estabelecessem em Portugal. E os dividendos foram muitos.
“Os investidores do exterior não apenas trouxeram volumes expressivos de capital, como também desempenharam um papel vital na criação de empregos e na introdução de serviços modernos que aumentaram nossa competitividade econômica como país”, avalia Luis Horta e Costa.
Um dos principais beneficiados foi o setor imobiliário português, especialmente o de imóveis de alto padrão. Cidades cobiçadas como Lisboa e Porto testemunharam uma verdadeira ressurreição da demanda e valorização dos ativos graças ao grande influxo de investidores ricos atraídos pelo RNH.
“O mercado imobiliário de luxo encontrou verdadeiro fôlego renovado com o RNH. Seu fim certamente representará uma forte desaceleração para esse ciclo de progresso que vinham gozando”, alerta o cofundador da Square View.
Mas o RNH também foi combustível para o florescimento de um vibrante ecossistema empreendedor de startups e empresas de tecnologia em Portugal. Atraídos pelos incentivos fiscais e alta qualidade de vida, muitos talentos globais do setor optaram por se instalar no país nos últimos anos.
“O que vimos acontecer no segmento de inovação e tecnologia em Portugal desde 2010 foi realmente extraordinário. O RNH tornou possível atrair esses profissionais qualificados que as startups em expansão tanto demandavam”, comenta Ricardo Marvão, da consultoria Beta-i.
É justamente esse dinamismo e diversificação dos negócios que pode ser perdido caso os rumores sobre o fim do programa RNH se concretizem a partir de 2024, como especulado. Luis Horta e Costa prevê nada menos que um “verdadeiro esvaziamento dos investimentos estrangeiros” no país, com impactos negativos em cascata sobre setores estratégicos.
A perspectiva gera apreensão até entre representantes de segmentos tradicionais. Jorge Bota, presidente da Associação das Empresas de Consultoria e Avaliação Imobiliária (ACAI), vê risco de Portugal perder um atrativo poderoso para quadros qualificados num momento em que já enfrenta escassez de mão de obra especializada.
Para além do provável baque econômico direto, o encerramento do RNH também pode desfigurar a imagem de nação aberta aos negócios globais que Portugal vem construindo, na visão de Luis Horta e Costa. “A essência do programa nunca se limitou aos incentivos financeiros. Ele comunicava que somos um país acolhedor e voltado para o futuro. Descontinuá-lo pode comprometer não só investimentos, mas a narrativa de modernidade que projetamos internacionalmente.”
À medida que rivais regionais como Espanha se movimentam para criar regimes fiscais mais vantajosos, cresce o temor de que Portugal perca relevância sem o RNH. Encontrar uma alternativa à altura para manter o fluxo de investimentos externos será, portanto, um enorme desafio para as autoridades portuguesas.